Declínio
da Igreja – Alvorada do Reino de Deus (CC)
(Deverá
“clicar” nas referências bíblicas, para ter acesso aos textos)
Recebi do prezado Engenheiro Geraldo Costa, residente no Rio de Janeiro, distinto
estudante de teologia que não se limita a ser mero receptor de informação, mas
examina e investiga toda a informação em estudo, a seguinte mensagem:
Nobre Camilo! Da mesma forma que você não tenho
religião, mas me intitulo cristão, por sinal sou um apreciador dos estudos
bíblicos, e gostaria de tirar uma dúvida com o nobre teólogo, nas passagens
sobre: “O REINO de DEUS”, parece que este título no evangelho está se
referindo a fatos distintos.
Mateus 12:28 “Na verdade é pelo
poder de Deus que eu expulso demônios, e isso prova que o Reino de Deus já chegou até vocês.” - Se Já chegou não seria o descrito acima.
Marcos 9:1 “E Jesus terminou, dizendo:
- Eu afirmo a vocês que isto é verdade: Estão aqui algumas pessoas que não
morrerão antes de verem o Reino de Deus
chegar com poder.” - Parece estar se referindo a
ação do Espírito Santo que está para chegar em Pentecostes.
Lucas 10:9 “Curem os doentes daquela
cidade e digam ao povo dali: "O Reino de
Deus chegou até vocês." - Semelhante a
Mateus 12.28
Lucas:17:20 “Alguns fariseus
perguntaram a Jesus quando ia chegar o Reino de
Deus. Ele respondeu: - Quando o Reino de Deus chegar, não será uma coisa
que se possa ver”. - semelhante a Marcos 9.1
Lucas 21:31 “Assim também,
quando virem acontecer aquelas coisas, fiquem sabendo que o Reino de Deus está para chegar.” - Destoa de todos os textos anteriores.
O nobre teria
algum estudo para sanar minhas dúvidas? Desde já agradeço!
Caro irmão e colega Geraldo
Quero dizer em primeiro lugar que não sou o nobre teólogo a que te referes, mas penso que, teólogo
é todo o que medita em Deus, com maior ou menor preparação teológica, quer seja
sacerdote, papa, pastor, presbítero, professor de seminário ou leigo como nós.
Infelizmente não há grandes teólogos. Todos nós somos pequenos teólogos, pois
grande… só Deus é Grande. Até penso que o leigo tem mais condições para meditar
em Deus que o “teólogo profissional” ligado a alguma igreja, que geralmente tem
mais informação e preparação teológica, mas está condicionado pelas normas e
tradições da sua igreja e pelo compromisso geralmente assumido de defender as
doutrinas da sua igreja e não as suas próprias ideias, portanto não tem a
liberdade de reflexão que os leigos têm. Eu sou um engenheiro como o irmão
Geraldo, mas já aposentado e quase a chegar aos 79 anos. À medida que a idade
avança e se vai aproximando o dia de “voltar à casa do Pai”, mais livre e
desligado me sinto das tradições das igrejas.
É verdade que tirei, já há muitos anos,
algumas cadeiras de teologia no Instituto Bíblico de Portugal de orientação
fundamentalista e depois tirei também outras cadeiras, algumas bem semelhantes
mas a outro nível mais elevado no Seminário Evangélico de Teologia de Lisboa,
para ver as diferenças entre os fundamentalistas e os tradicionais. Portanto,
tenho alguma preparação teológica, mas nunca terminei nenhum curso de teologia.
Só tirei as cadeiras que me despertavam mais interesse pelos assuntos abordados
e/ou pela qualidade dos seus professores. Talvez te vá escandalizar se
confessar que frequentei essas duas escolas de teologia com a mesma mentalidade
com que vou a algum restaurante, peço o que me interessa e mais aprecio e não
me preocupo com os outros pratos. Portanto, não sou pastor, muito menos
professor, mas tenho todo o prazer em trocar impressões fraternalmente sobre
assuntos de teologia, com pessoas que tenham a liberdade de meditar, o que
geralmente não acontece com quem está ligado a alguma igreja e se sente
obrigado a defender as doutrinas da sua denominação.
Tens razão em me perguntar sobre o
significado do Reino de Deus, ou Reino dos Céus, ou Reino de Jesus Lucas 22:30 que muitos confundem com a Igreja.
Nos nossos dias, muito se fala em Igreja ou
igrejas e o Reino de Deus ficou um
tanto esquecido.
Já deves ter reparado que Jesus pouco falou
sobre a Igreja. Só duas vezes Jesus emprega a palavra igreja em Mateus 16:18 e
em Mateus
18/17, mas nesses versículos, devemos interpretar a palavra
igreja, dita por Jesus no seu contexto histórico, pois a palavra já existia em
ambiente secular, significando uma assembleia convocada para reunir todo o povo
e decidir assuntos comuns a toda a cidade, nomeadamente para reunir os
guerreiros quando a cidade estava em perigo, podendo também significar o local
onde tal reunião se realizava. Penso que inicialmente Jesus se referiu à “ekkyêsia” como uma metáfora, assim como em João 14:6
quando disse que era o caminho ou em Mateus 5:14
quando disse que os crentes eram a luz.
Só a partir do livro de Actos é que a palavra
igreja foi adquirindo uma grande
carga teológica, tornando-se palavra de teologia, como acontece na nossa
cultura.
Reino
de Deus, ao contrário da palavra igreja, era já palavra da
teologia na época de Jesus, antes de se formar o cânon veterotestamentário, e
há algumas referências ao Reino, mas
só nos textos que mais tarde foram considerados deuterocanónicos. Julgo ser
esse o principal motivo dos protestantes e evangélicos não fazerem referência a
essas passagens. Podemos ver Reino de Deus em Sabedoria 10:10, reino de teus pais em 1º Macabeus 11:9 ou reino de
meus pais em 1º
Macabeus 15:3. Essas referências ao Reino nos textos deuterocanónicos, muito citadas no tempo de Jesus,
jugo serem fruto desse contexto histórico em que Israel perdeu a sua
independência, pois embora sejam referências escatológicas ao Messias, anunciam
um Messias guerreiro como o próprio nome de “Filho de David” sugere, portanto
um Messias que os iria libertar do Império Romano e restabelecer o Israel do
tempo dos reis David e Salomão. Este pormenor é importante para se compreender
o entusiasmo com que Jesus foi recebido, para depois ser rejeitado por não ser
o tipo de Messias que os judeus esperavam e desejavam.
Não encontrei referências ao Reino de Deus nos textos canónicos
veterotestamentários, mas no Novo Testamento, a expressão Reino de Deus aparece 49 vezes nos evangelhos e só 13 vezes no
resto do Novo Testamento.
Talvez o primitivo cristianismo tenha deixado
de falar em Reino para não ser mal interpretado pelos judeus, pois de acordo
com Actos
2:32/36 ou Filipenses
2:9/11, após a ressurreição, Deus exaltou a Cristo e cumpriu o
estabelecimento do Seu Reino duma forma que os judeus não esperavam nem
desejavam.
Também Paulo, que deu a grande ênfase à
Igreja, fala do Reino de Deus. Por
vezes como acontecimento futuro, como em 2ª Timóteo 4:1 ou 2ª Timóteo 4:18,
mas em Romanos
14:16/18, 1ª
Coríntios 4:18/21 ou 2ª Pedro 1:11
refere-se ao Reino como acontecimento bem presente.
Não sei se, nas passagens que o ir. Geraldo
menciona (ou noutras passagens das epístolas), Jesus se estaria referindo a
coisas distintas, mas certamente que bem distintas foram as interpretações que
os judeus deram às suas palavras. O Velho Testamento defendia uma teocracia e
as leis foram dadas pelo deus dos judeus. Assim eles identificavam o Deus
Supremo que Jesus ensinou a tratar por Pai, com o rei de Israel. Segundo a
interpretação dos judeus, o Messias viria na continuidade do Velho Testamento,
para ser o rei dos judeus, libertá-los do Império Romano e continuar a
tradicional luta imperialista contra todos os outros povos. Penso que era este
conceito de Reino de Deus que tinham
os fariseus que em Lucas
17:20/21 perguntaram a Jesus quando viria o Reino de Deus, pensando certamente na hora de pegar em armas para O
apoiar.
Na nossa cultura, a palavra reino está relacionada com um
território onde determinado Rei exerce a sua autoridade. Mas a palavra grega “basileia”, que foi traduzida por “reino”, refere-se mais ao
domínio ou influência de determinado rei, sem implicar necessariamente a sua
autoridade sobre algum território. Era essa a situação de Israel quando
caminhava pelo deserto, pois já era um reino, embora ainda não tivesse um
território.
Talvez isso possa explicar as dúvidas que
temos em relação ao tempo da chegada do Reino
de Deus. Nessas passagens, alguns já estavam sob a influência de Deus ao
contrário de outros que ainda estavam muito preocupados com a circuncisão,
genealogias, rituais e mandamentos de Moisés. Talvez a situação não fosse muito
diferente do que se passa nos nossos dias em que alguns estão muito preocupados
em ter o seu nome na lista de membros de alguma igreja, em cumprir os seus
sacramentos ou ordenanças, dão demasiada importância aos cargos eclesiásticos
mas esquecem os grandes ensinos e os ideais do Mestre, que são a única e
imprescindível condição para pertencer ao Reino
que Jesus anunciou.
Julgo que seria mais correcto escrever
“reino” com letra minúscula, assim como escreveríamos “influência” de Deus, ou
“domínio” de Deus. Mas já se tornou tradição escrever Reino de Deus. Pessoalmente, simpatizo
muito mais com a expressão Reino de Deus
do que com a palavra Igreja.
A palavra Igreja tem uma pesada carga teológica que nos leva a pensar nos
muitos problemas, rituais, hierarquias etc, que de
certa maneira nos separam de Deus, enquanto pertencer ao Reino de Deus, significa estar sob a influência directa de Deus.
Numa igreja, sabemos quem são os seus membros e onde se reúnem, mas os cidadãos do Reino de Deus,
só Deus os conhece.
Nós os dois, e muitos mais em todo o mundo,
que não pertencemos a nenhuma igreja nem religião, podemos afirmar que
pertencemos ao Reino de Deus que
Jesus anunciou, se formos influenciados pelos seus valores e pela sua mensagem,
independente de quaisquer hierarquias ou rituais.
Essa diferença tem grandes implicações nos
nossos dias, pois como dissemos, só pertence às igrejas dos nossos dias quem
tiver o seu nome inscrito na sua lista de membros e tiver cumprido os rituais
dessa igreja para admissão dos seus membros. Mas, será que ser membro duma
igreja é garantia suficiente de se pertencer ao Reino de Deus?
E
quantos há, nos nossos dias, que apesar de desiludidos e afastados das igrejas
continuam em sintonia com o pensamento divino revelado por Cristo? Certamente
que não são membros de nenhuma igreja. Mas poderão ser cidadãos do Reino de Deus? Quais as fronteiras do Reino de Deus? Poderá o Reino de Deus incluir outras religiões?
Estou a lembrar-me do caso de islâmicos que não aceitam a divindade de Cristo
mas consideram-no como um Profeta e muitos deles estão prontos a dar a vida
pelo seu Profeta e seguem o pensamento de Cristo. Ou o caso de alguns hindus
que aceitam a Cristo como um deus que colocam ao lado de muitos outros, mas
conhecem e meditam na mensagem de Cristo. Foi também este o caso do hindu Mahatma Gandhi que era um admirador da mensagem de Cristo
e que chegou a afirmar: Eu seria cristão, sem dúvida, se os cristãos o fossem
vinte e quatro horas por dia. As suas ideias e pensamentos são dum verdadeiro cidadão do Reino de Deus. As
afirmações de Jesus em Mateus
25:31/40 levam-nos a pensar que muitos que nunca ouviram falar em
Jesus Cristo, ou conheceram-no só como o deus dos povos que invadiram os seus
países e escravizaram os seus povos, ficarão admirados de Jesus bem os conhecer.
Bem sei que o simples abordar desta questão
será muito incómodo para muitos leitores mais agarrados às tradições das
igrejas, mas como o Mestre deu a entender na parábola do trigo e do joio, não
nos compete decidir quem pertence ao Reino
de Deus. Mateus
13:24/30. Quem nos autoriza a monopolizar Deus limitando-o a
alguma igreja ou religião?
Nós podemos ser protestantes, católicos,
islâmicos, evangélicos, judeus, budistas ou hindus etc. mas Deus não é nada
disso. Deus está muito acima da nossa teologia e nossas tradições.
Vejo nos evangelhos que, enquanto Jesus
Cristo deu toda a ênfase ao Reino de
Deus e não se preocupou com organizações e cargos eclesiásticos, foi Paulo
que deu ênfase à Igreja e sua organização que se foi tornando cada vez mais
pesada ao longo dos tempos. A ideia de Jesus, do Reino de Deus, ao longo do livro de Actos foi perdendo gradualmente
a sua importância a ponto de ficar esquecida.
Mas também o conceito de igreja foi evoluindo
ao longo dos tempos. Assim como todas as religiões,
nascem em determinado contexto histórico atingem o seu apogeu e entram em
declínio quando muda esse contexto histórico que marcou a sua origem se não se
souberem adaptar aos novos tempos, julgo que o mesmo acontece às igrejas.
Encontramos no Pentateuco certas afirmações
sobre a exclusividade do deus dos judeus e os estrangeiros, que nos parecem
chocantes, pois geralmente o estrangeiro era o inimigo. Penso que isso foi o
resultado dos 40 anos que andaram pelo deserto, invadindo territórios de outros
povos. Claro que todos os outros povos reagiam aos israelitas que invadiam as
suas terras. Assim, o estrangeiro era o inimigo, e o deus dos judeus, reagiu
como qualquer outro deus dessa época, deus da tribo ou da cidade, que lutava ao
lado do seu povo, contra todos os outros povos e até os incentivou a cometer
crimes horrorosos em nome da sua religião como vemos por exemplo em Números
31:8/18 entre muitas outras passagens que os mais “espirituais”
consideram as grandes manifestações do poder de deus… Mas que deus?! Será que
foi o Deus supremo, o Pai, que Jesus nos revelou? Estará essa atitude em
sintonia com o comportamento do nosso Mestre?
Jesus demarcou-se desse conceito de deus dum
povo ou deus dum local, apresentando o Deus supremo, criador de todos os povos,
pois o contexto histórico já era outro bem diferente. Já viviam na
“globalização do Império Romano” em que todos os povos conhecidos dessa época
eram obrigados a viver segundo o conceito de liberdade dos romanos, que em
alguns aspectos era mais semelhante ao dos nossos dias. Nessa época, os judeus
já não podiam cumprir Números
33:50/53 ou Deuteronómio
12:1/3, pois no Império Romano havia liberdade de religião, que
todos os povos sob seu domínio foram obrigados a aceitar, respeitando as outras
religiões. Até os próprios israelitas beneficiaram da Lei Romana, pois passaram
a ter o direito de escolher qualquer religião.
Claro que essa transição dos pequenos grupos
do primitivo cristianismo para a poderosa Igreja com os seus exércitos, foi gradual através dos tempos.
Actualmente assistimos
ao declínio das religiões, nomeadamente nos países mais evoluídos, fruto do
actual contexto histórico. Penso que isso é a evolução da religião.
Jesus falou do Reino de Deus aberto a todos os povos, sem hierarquias, quando
disse que uma criança era o mais importante dos seus discípulos Mateus
18:1/5 e Ele próprio deu o exemplo quando lavou os pés dos
apóstolos em João
13:12/17. Foi essa mentalidade que prevaleceu no primitivo
cristianismo, quase até ao Concílio de Niceia (325). Já imaginaste o que seria
se o actual Papa Francisco convocasse todos os Cardeais, para depois chamar
alguma criança e dissesse: “Se não nos
fizermos como uma criança, não conseguiremos renovar a Igreja.” ?! Mateus
18:1/4
No primitivo cristianismo, logo depois da
ascensão de Cristo, havia uma forte mentalidade cristocêntrica dirigida pelo
Espírito Santo. Era o cumprimento da chegada do Reino de Deus. Mas bem cedo, essa mentalidade livre e espontânea,
que se baseava nas descrições dos apóstolos ainda presentes e nas primeiras
epístolas que apareceram, sofreu o ataque dos judaizantes que tentaram impor as
tradições do judaísmo, os seus textos e seus rituais. As poucas informações que
chegaram aos nossos dias estão no livro de Actos e nalgumas cartas de Paulo que
sempre defendeu a liberdade em Cristo. Nesses primeiros anos aparecem vários
evangelhos escritos pelos apóstolos e outros crentes contemporâneos de Cristo.
Lucas, no início do seu Evangelho refere-se aos vários evangelhos que
apareceram nessa época Lucas
1:1/4. Segundo alguns historiadores, havia nessa época dezenas
de evangelhos que não foram incluídos no cânon neotestamentário. Alguns desses
evangelhos apócrifos chegaram aos nossos dias e estão publicados em italiano no
livro “Apocrifi del Nuovo Testamento” de Luigi Moraldi,
professor de hebraico e fitologia semítica na Universidade de Pavia. Mas há uma
tradução que foi publicada pela Paulus, com o título
“Evangelhos Apócrifos”.
Penso que há pouca informação dessa época, em
que se formou a teologia cristã, certamente com muita polémica nem sempre
resolvida pacificamente. Paulo na sua luta contra os judaizantes, evitou que a
circuncisão fosse aceite pelos cristãos, mas aceitaram os textos do Velho
Testamento em pé de igualdade com o Novo Testamento mesmo os que Jesus
rejeitou. Mateus
5:20/48 Gradualmente o ambiente foi-se alterando. Depois dos
apóstolos falecerem só lhes restava seguir os textos bíblicos, numa época em
que o Novo Testamento ainda não estava completo e nem havia o cânon
veterotestamentário, começaram a dar todo o valor aos textos bíblicos, situação
que se mantem até hoje, como se Jesus tivesse dito “Não vos deixarei órfãos. Deixo-vos as escrituras.” João
14:14/18. Assim, a mentalidade cristocêntrica do Reino de Deus, dirigida pelo Espírito
Santo, foi gradualmente substituída pela mentalidade eclesiocêntrica com base
numa interpretação literal das Escrituras tanto do Velho como do Novo
Testamento em pé de igualdade, os cristãos tornaram-se mais ritualistas e
foi-se formando uma poderosa hierarquia, arrogante e autoritária que tem
prevalecido até aos nossos dias.
Claro que essa evolução nunca foi contínua.
Podemos citar o caso de Lutero que reagiu contra o autoritarismo papal da sua
época para tornar a Bíblia acessível a todo o povo. Mas infelizmente esse
entusiasmo do tempo da Reforma Protestante já passou à história e na maior
parte das igrejas protestantes já se abandonou o entusiasmo pelo estudo da
mensagem de Cristo. Diminuiu drasticamente o número de escolas bíblicas
dominicais participativas para todos os adultos, assim como outras reuniões de
estudo bíblico com livre participação da assistência.
Se compararmos a realidade actual com a do
tempo de Cristo, certamente que uma das grandes diferenças está nos meios de
informação em geral, nomeadamente na divulgação dos textos considerados
sagrados.
No primitivo cristianismo nem todos sabiam
ler, muito poucos teriam prática de escrever e não havia bíblias como as
actuais. Nas várias sinagogas e primitivas igrejas cristãs, havia os “livros”
dessa época, rolos de papiro ou pergaminho manuscritos, que desenrolavam muito
cuidadosamente para ler algumas passagens. Isso dava um especial significado à
leitura dos textos como momento raro e solene que muitos aguardavam durante
dias. Para tal, era necessário o povo ajuntar-se para que algum escriba pegasse
nos valiosos textos sagrados cujo valor económico não estava ao alcance do
vulgar crente. Essa situação manteve-se até ao século XV quando apareceu a
imprensa e foi publicada a primeira bíblia completa em alemão. Hoje podemos
dar-nos ao luxo de ter várias traduções da Bíblia nas nossas casas além dum
grande número disponível na internet.
A Igreja foi imprescindível, ao longo dos
séculos, para a preservação da Bíblia, embora a sua divulgação não fosse
incentivada durante e idade média, pois nem tudo que está no Velho Testamento é
bom, pois há passagens que podem ser consideradas incentivos ao racismo, forte
discriminação da mulher, e temos fundamento para a escravatura, poligamia, pena
de morte etc. Compreendo que no passado a Igreja Católica não incentivasse a leitura
da Bíblia que actualmente está praticamente traduzida em todas a línguas.
Mas a antiga expressão “ESTÁ ESCRITO…” perdeu o seu impacto nos crentes. Numa época em que
praticamente todos sabem ler e escrever, penso que a importância das igrejas já
está diminuída como único meio de transmitir o Evangelho.
Será que se aproxima o fim da religião, ou
das religiões?
Noto que a assistência nas igrejas está a
diminuir, principalmente nas classes mais cultas, assim como o número dos sem
igreja sem igreja vai aumentando. Quando falo nos “sem igreja” ou
“desigrejados” não me refiro só aos que nunca se identificaram com uma igreja,
mas principalmente aos que se afastaram desiludidos das igrejas.
Mas o que nos dizem esses que se afastaram
das igrejas? Geralmente falam mal das igrejas e sua organização, mal dos
padres, pastores e todos os clérigos… Mas Jesus Cristo está imune a essas duras
críticas. Continuam crentes de uma outra forma que não se adapta às igrejas dos
nossos dias. Penso que ao longo deste século haverá mudanças que aliás já se
notam nas várias igrejas. Não só no Catolicismo assistimos à substituição do
anterior Papa, que deixa uma Igreja desprestigiada e
hierarquizada, para ser substituído pelo Papa Francisco que começa por pedir aos
crentes que rezem por ele, mostrando uma atitude oposta à do seu antecessor. Até
tenho notado nalgumas declarações do actual Papa Francisco, que há uma certa
tendência em se afastar da igreja tradicional, burocrática, centralizada e
hierarquizada, com dirigentes revestidos de muita autoridade, mas sem
credibilidade em ambiente secular, fora das quatro paredes das igrejas, para
tentar ser alguma “coisa” mais parecida com o Reino de Deus. Lembro-me de, no século passado um Papa visitar a
Índia (já não sei qual foi) e ter de ser protegido pela polícia indiana dos
manifestantes que queriam que pedisse desculpa pelos crimes cometidos no
passado. Mas vi as freiras da Madre Teresa de Calcutá andar por toda a Índia,
por vezes sozinhas de autocarro (ónibus) ou de bicicleta pelos bairros mais
pobres e por todas serem respeitadas. O que têm elas que a hierarquia da Igreja
Católica já perdeu?
Também noto no Protestantismo, em especial
nas classes mais cultas um grande descrédito pelas igrejas e o aparecimento de
pequenos grupos de meditação, oração e estudo bíblico de leigos protestantes
desligados das igrejas, geralmente com melhor preparação teológica do que os
que enchem algumas igrejas protestantes ou evangélicas e se limitam a ouvir o
seu “quase infalível” pastor. Quando falo nos pequenos grupos de reflexão
teológica, também incluo os que estão ligados pela internet, em pontos bem
distantes do nosso mundo, unidos pelos contactos pela internet, muito
criticados e indesejados por alguns, pois não podem ser sujeitos a censura
teológica. Na verdade, os pequenos grupos de estudo bíblico deixaram de se
limitar a determinado local para se estenderem a nível mundial.
Mas isso…. em certos
aspectos, é mais parecido com os pequenos grupos do primitivo cristianismo.
Penso que não será o fim do cristianismo, mas o declínio das igrejas que dará
lugar à alvorada do Reino de Deus,
como Jesus anunciou.
Camilo –
Marinha Grande, Portugal
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Outubro de 2013
Estudos
bíblicos sem fronteiras teológicas
COMENTÁRIOS RECEBIDOS
Arménio Anjo – Leiria,
Portugal
Outubro de 2013
Acabo de ler o teu artigo e, do meu ponto de vista, está muito bem
apresentado.
Satisfará ele por completo a questão apresentada? É
possível.
No último parágrafo referes-te à “Alvorada do Reino de Deus",
preconizada por Jesus.
Para mim, o reino de Deus já está entre nós desde Jesus Cristo.
Todavia, não ainda na sua PLENITUDE, o que só acontecerá no "fim dos
tempos", na altura da ceifa, de que fala a parábola do trigo e do
joio. Este tempo de espera até a ceifa, é o tempo da MISERICÓRDIA
do Senhor, tempo de reflexão, tempo de arrepiar caminho, dando oportunidade ao
joio de se tornar trigo.
É o meu ponto de vista, claro.
Osni de Figueiredo – São
Paulo, Brasil
Outubro
de 2013
“Nós os dois e muitos mais em todo o mundo,
que não pertencemos a nenhuma igreja nem religião, podemos afirmar que
pertencemos ao Reino de Deus que
Jesus anunciou, se formos influenciados pelos seus valores e pela sua mensagem,
independente de quaisquer hierarquias ou rituais.”
Entendo
ser esta uma tendência e que muitos estejam convergindo à
isto mesmo nesta reta final.
Os
interesses escusos na quase totalidade das denominações vem afastando aqueles
que não se conformam em ser joguete de hegemonias eclesiásticas.
David de Oliveira
– Goiânia, Brasil
Outubro
de 2013
Li
o artigo sobre o "Reino de Deus" e como era de se esperar, é mais um
comentário sincero, franco e isento de tendências doutrinárias.
Segundo
o "Comentário Bíblico Atos" do Novo Testamento, página 853 em seu
glossário, "Reino" tem o significado de "governo", reinado
ou autoridade (não é povo, ou a terra de um rei).
Os
judeus esperavam o "reino" do Messias no futuro, com o
estabelecimento de uma nova, agressiva e potente ordem pela força bélica à
semelhança do reinado de seu rei David. O "Deus de Israel" governaria
o mundo tendo como base administrativa Jerusalém e todos os outros povos, os
gentios, seriam submetidos à sua justiça. "O
Senhor enviará o cetro da tua fortaleza desde Sião, dizendo: Domina no meio dos
teus inimigos". Salmos 110:2
No
que se refere aos cristãos, Jesus veio, inaugurou com o Seu evangelho o Seu
reino. Diferentemente da expectativa dos judeus, o evangelho ou "boas
novas" é o conjunto de novidades pacíficas incomuns frente ao ambiente
"mundano" ou secular. Esse conjunto constitui toda a
instrumentalização para se conseguir viver o Seu reino primeiramente aqui nessa
vida, como uma espécie de preâmbulo para a segunda vida, a espiritual, depois
do arrebatamento.
Álvaro Moraes – Belo
Horizonte, Brasil
Outubro
de 2013
AMIGOS
IRMÃOS: CAMILO E GERALDO,
Eu moro aqui
em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
Estas
questões teológicas já me interessaram muito, mas hoje, com 56 anos, eu a cada
dia, me interesso menos. Ou melhor: Nada.
Nasci em um
lar Metodista, e por motivação existencialista (medo da Morte), fui buscar conforto
no Pentecostalismo (Igreja Assembléia de Deus). Hoje
vejo que foi um grande erro. Passei ali os 30 melhores anos de minha vida: A
juventude. Me desinteressei de estudar, de lazer, de esportes,
de amigos "do mundo". Mas, a partir 2005, ou um pouco mais, me
estressei totalmente de religião. Estava deprimido, tive pânico e outras crises
existenciais, que já me acompanhavam desde há tempos.
Tudo
começou, pelo menos conscientemente, quando eu tinha 13 anos, e nossa família
fez uma mudança brusca de cidade. Perdi tudo: amigos, vida social e etc. Aos 17
anos fui parar em um Movimento, que, à época, não
tinha nome, era uma comunidade. Ambiente cristão muito bom, principalmente a um
jovem, que queria algo de Deus. Depois se deteriorou. Ainda existe hoje, muito
diferentes: Arrogantes, alienados, pretensiosos e facciosos. Aos 19 anos fui
parar na Assembléia de Deus.
Depois de
algum tempo a gente aprende, e eu aprendi que servir a Deus, é uma liberdade, e
eu não tinha. Servir a Deus é amar, e eu não amava (e ainda não sei
totalmente). Chamava alguns de irmãos e nem amigos deles
eu era, talvez só os conhecia e mal conhecia. Toda
noite só dormir com ansiolítico, fazia uso de anti-depressivos
constantemente e aí eu disse para mim mesmo: Isto é ser de Deus, e isto, ou eu estou faz parte do REINO DE DEUS?
Busquei
muito, li bastante (e ainda leio) tudo. Li principalmente autores não
evangélicos. Passei a ver sites diversos, coisa muito
eclética mesmo, e o que eu mais acesso é o www.caiofabio.net. Não tenho
o Caio como meu guru, ou guia espiritual e até discordo do jeito com ele
aborda, alguns pessoas. Tenho muita restrição a modo dele agir, mas por outro lado,
concordo com quase tudo (principalmente o fundamental) que ele proclama. Para
mim ele é um dos profetas do Reino de Deus, assim como o Camilo aí em Portugal,
você Geraldo e outros mundo a fora.
O Reino de
Deus, eu sinceramente penso que seja tão grandioso,
que será uma surpresa para nós quando o divisarmos na glória. Ficaremos alegres
e estupefatos. Não quero ser universalista, mas Deus tem tanta graça para
aqueles que ele criou, graça esta
que não imagina, o melhor corações dos homens.
Nosso
Rei/Mestre e Senhor, ao nascer, foi visitado por três seres, que não seriam recebidos em igreja cristão
alguma, principalmente evangélica, e pior ainda por alguma pentecostal ou
neopentecostal, de onde sairiam (aqui no Brasil), expulsos pela Lei dos
Direitos Humanos. Viveu com gente da pior espécie, não teve por relacionamento
com religiosos, critico-os o tempo todo, pegava muito no pé deles, parece até
que não gostava deles. Fui perseguido por eles e por fim morto. Depois de
morte, perseguiram os seus discípulos, os seus seguidores. Mas, Mas, eis que no
inicio do século 4, veio a maravilha: O imperador,
desacreditado e perdendo o poder, se une a este povinho perseguido, mas que não
se entreva, pois tinha uma fé tremenda e os usa. Estava aí formado o tal
CRISTIANISMO. O maior inimigo do Reino de Deus até hoje criado. Muito eficaz e
que solapa por dentro com aparência de Reino de Deus, mas que não passa de
reino humano e talvez até diabólico.
Concluindo:
Amigos, o evangelho é simples, mas a aplicação dele demanda muita consciência e
decisão que eu creio que vocês são expoentes de Deus, para discretamente sem
alerde vivê-lo e nele servi-lo. Vocês, e eu também tendo fazemos o que dever
ser feito, com aquilo que temos: O Espirito de Deus, simples e anônimo. Uma mão
faz e a outro nem precisa, nem deve sabê-lo.
Abraços na
paz de Deus ao meu amigo (embora nunca nos vemos, mais ainda nos veremos na
glória) Camilo e ao Geraldo, amado no Senhor.
Álvaro jr.
Manuel Pedro Cardoso – Figueira da Foz, Portugal
Outubro
de 2013
Se
eu fosse pessimista, diria frases dez vezes mais severas sobre a Igreja do que
as que diz o Engº Camilo Coelho no seu artigo
"Declínio da Igreja - Alvorada do Reino de Deus”.
Na
verdade, desde 1964 estou envolvido numa Igreja, primeiro como
seminarista-pregador e depois (1970) como pastor e tenho encontrado ao longo
deste meio século na máquina eclesiástica leigos e pastores disparatados,
mentirosos, desonestos que, além das minhas faltas pessoais, seria natural que
tivesse da Igreja uma ideia triste. Mas não tenho e isto porque a Igreja é
formada por homens e mulheres e por isso imperfeita - mas mesmo assim não
podemos esquecer que ela é o Corpo de Cristo e tem como principal missão,
justamente, anunciar o Reino de Deus, que já veio, que vem todos os dias e virá
no fim dos tempos. Não estou muito certo de que haja um declínio da Igreja (o
que assistimos hoje é talvez a sua depuração), mas estou convicto de que só
podemos servir a Deus servindo os homens e aceitando-os na sua imperfeição. O
livro de Actos mostra-nos como a Igreja, unida como um só corpo, avançou
vitoriosamente na proclamação do Reino.
Um
abraço do Manuel P. Cardoso.
Victor Francisco –
Marinha Grande, Portugal
Outubro
de 2013
Achei a
colocação do senhor Eng. Geraldo Costa interessante e
a sua posição/opinião também muito actual pois é um assunto que preocupa todo o
cristão, porém na minha modesta opinião tenho uma visão da igreja mais
positiva, claro que não me refiro a uma denominação, mas sim ao corpo de Jesus
o Cristo.
Há várias
passagens das escrituras que se referem aos cristãos, como ajuntados,
reunidos Romanos
8:17, feitos herdeiros, arrebatados juntos 1ª Tessalonicenses 4:17,
etc.
Seguir a
Cristo significa pertencer, João 15:4.
Podemos dar
sem amar, mas jamais amar sem dar.
Somos chamados
a pertencer e não somente a crer, e claro que não me refiro a mais um nome numa
lista de uma denominação, seja ela qual for.
Jesus disse:
“edificarei a minha igreja, e as forças do Inferno não prevalecerão contra
ela”, por isso acredito que a igreja Corpo de Cristo seja indestrutível.
O problema é
que muitos cristãos usam a igreja mas não a amam, não têm consciência do
Corpo de Cristo. Todos os erros dos cristãos (e são muitos), padres,
pastores, etc, não serão suficientes para destruir o
Corpo de Cristo
Somos
exortados a “amar uns aos outros” 1ª Tessalonicenses 4:9
e 1ª João
4:11/12, “admoestar uns aos outros” Romanos 15:14,
“ensinar uns aos outros” Actos 5:42 e Actos 11:26 etc,
e para isso temos que saber ser Corpo de Cristo.
Jesus não
prometeu edificar o ministério de um pastor, padre ou qualquer outro, mas sim
edificar a sua igreja.
Quando nos
reunimos na igreja como uma família em amor, levamos ao mundo um poderoso
testemunho, pelo nosso amor o mundo nos conhecerá como cristãos.
Quando
aceitamos Jesus o Cristo, temos salvação, quando nos
congregamos, temos comunhão.
Provavelmente
as igrejas, todas elas, num futuro próximo irão sofrer alterações, e adaptações
de vária ordem, mas a Palavra prevalecerá, por isso terá que ser o mundo a
aceitar o Corpo de Cristo, e não o contrário, pois esse é o plano do nosso
Criador.
Sobre o
futuro não sei como tudo se irá passar, mas acredito no plano de Deus e no
Corpo de Cristo como imutáveis e eternos.