Fundamentalismo (CC)

(Fundamentalismo evangélico)

(Deverá “clicar” nas referências bíblicas, para ter acesso aos textos)

 

 

1 – Introdução

 

Ao colocar o artigo “Fundamentalismos (MC)” do Pastor Manuel Pedro Cardoso, que transcrevemos duma revista da Igreja Lusitana, convidámos o autor a dar um maior desenvolvimento a esse seu artigo, pois numa página da internet já não há as mesmas limitações de espaço duma revista, sendo possível abordar o assunto com maior desenvolvimento.

Em face do esclarecimento do Pr. Cardoso, de que tinha a intenção de se limitar a alertar para a importância deste assunto e incentivar à investigação e reflexão teológica, surge aqui, através deste artigo, a minha contribuição para a compreensão do fenómeno do fundamentalismo de que tanto se fala nos nossos dias.

 

 

2– Significado etimológico de “fundamentalismo”

 

Esta palavra não aparece no dicionário etimológico em cinco volumes, de José Pedro Machado, pelo que temos de concluir que se trata dum neologismo derivado da palavra “fundamento” que vem do latim “fundamentu” significando fundamento, base, suporte, fundo do mar.

Na cultura em que Jesus viveu, não era conhecida a técnica das fundações dos edifícios, e é nesse contexto cultural que deve ser entendida a parábola da casa construída sobre a areia Mateus 7:26. Já os romanos conheciam a técnica da escavação do terreno arenoso e o aumento da superfície de apoio diminuindo assim a pressão até um valor aceitável para o tipo de terreno, e ainda há pontes de pedra, construídas pelos romanos, assentes em areia, que se mantêm em funcionamento depois de tantos séculos, não só em Portugal como noutros países europeus.

Portanto, “fundamentalismo” será alguma coisa, ou atitude que tende a valorizar as bases, o suporte físico, cultural ou filosófico que deu origem a toda a estrutura física ou pensamento filosófico ou teológico.  

Fundamentalismo é uma palavra que apareceu inicialmente ligada à teologia protestante, mas essa atitude dos fundamentalistas já existia muito antes da palavra aparecer. De certa forma, as cruzadas do catolicismo romano para a conquista de Jerusalém, embora tivessem motivos políticos e económicos, estes foram apoiados pela interpretação fundamentalista dos textos veterotestamentários, bem como, pelo obscurantismo medieval em que a “verdade” era imposta e “demonstrada”, não pela força dos argumentos, mas pela força das armas. Podemos também mencionar os métodos de “evangelização” utilizados pelos missionários católicos no Oriente, nomeadamente na Índia, com actos de violência com apoio da Inquisição e fortes pressões económicas, que só podem ter explicação com base numa interpretação fundamentalista dos velhos textos de Moisés e Josué. Estes factos históricos, pouco conhecidos no ocidente, estão ainda “vivos” na memória dos hindus, pois, ao contrário do que aconteceu em África e no Brasil, habitados nessa época, por povos primitivos que não nos deixaram quaisquer registos históricos, no Oriente ficaram documentos escritos que chegaram aos nossos dias.

Em todo o Velho Testamento se nota essa mentalidade fundamentalista que, com base nos textos religiosos, não tolerava qualquer desvio de opinião, muito menos a liberdade de religião. O próprio Cristo foi crucificado por pregar uma nova mensagem que não estava de acordo com os ensinos de Moisés e por se ter tornado impuro ao tocar em leprosos para os curar ou por ter transgredido a lei do sábado ao curar doentes nesse dia, transgressões que eram punidas com a pena de morte, de acordo com uma interpretação fundamentalista da Lei de Moisés.

 

 

3 – Alguns dados históricos mais recentes

 

Este neologismo “fundamentalismo”, surgiu no fim da Primeira Guerra Mundial, pelo que o seu significado original está certamente ligado ao contexto histórico que lhe deu origem. Nessa época, o protestantismo tradicional, sofria fortes ataques da teologia liberal, da alta crítica alemã e do darwinismo, que defendiam uma interpretação naturalista da Bíblia, pelo que, a identificação como fundamentalista, representava, nesse contexto histórico, uma afirmação de fidelidade ao protestantismo histórico e tradicional.

Foi cerca do ano 1920 que a Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana americana afirmou cinco doutrinas fundamentais, que funcionaram como uma espécie de “dogmas” protestantes: 1) Inerrância da Bíblia, 2) Nascimento virginal de Cristo, 3) Morte vicária de Cristo, 4) Ressurreição corpórea de Cristo, 5) Historicidade dos milagres. Noutras igrejas, a situação foi muito semelhante.

Cerca do ano 1923, aparece o liberalismo ou modernismo em oposição ao cristianismo tradicional.

Nos primeiros 20 anos, até cerca de 1940, os fundamentalistas fracassaram na sua tentativa de proibir que o darwinismo fosse ensinado nas escolas públicas, assim como não conseguiram expulsar os modernistas das suas denominações, pelo que fundaram novas denominações fundamentalistas que diziam representar o verdadeiro cristianismo, com base numa interpretação literal da Bíblia. Mas cedo acabaram por se dividir entre si, devido a pequenas divergências, dando origem a muitas novas denominações.

Cerca do ano 1970, os fundamentalistas dividiram-se em dois grupos: Havia os que continuavam a identificar-se como fundamentalistas, dizendo representar o verdadeiro cristianismo fiel à Bíblia, do Génesis ao Apocalipse, e havia os que rejeitaram tal termo que nessa época já estava identificado com divisionista, intolerante, ignorante, anti-intelectual, indiferente aos problemas sociais etc. Foi esta facção de fundamentalistas mais moderados, que a partir de 1940, passou a utilizar o nome de “evangélicos”.

No entanto, nos Estados Unidos da América, praticamente não havia diferenças entre fundamentalistas e evangélicos. Ambos defendiam o reavivamento, a evangelização, as políticas de direita e combatiam o tabaco, as bebidas alcoólicas, o cinema, a TV, todas as formas de jogo, assim como combatiam o comunismo e os partidos de esquerda, facto que levou o Governo dos EUA a apoiar economicamente as igrejas evangélicas e suas missões, principalmente em países de tradição não cristã, ou não evangélica fundamentalista. Consta que houve verbas do Ministério da Defesa dos EUA aplicadas na evangelização do Brasil, como forma de combater o comunismo e divulgar a cultura norte-americana.

Já em fins do século passado, julgo possível considerar a nível mundial, os protestantes, identificados com as suas igrejas históricas, e os evangélicos ou fundamentalistas, visto não haver grandes diferenças entre estes dois, embora o nome mais utilizado nos nossos dias seja o de “evangélico”.

Em Portugal, onde o protestantismo é relativamente recente, esta divisão não é bem nítida. Mas, duma maneira geral, pode-se dizer que os protestantes estão ligados ao COPIC (Conselho Português de Igrejas Cristãs) enquanto os evangélicos estão ligados à AEP (Aliança Evangélica Portuguesa). Mas, como dissemos, esta divisão não é bem nítida, havendo por exemplo a “Igreja Evangélica Presbiteriana de Portugal” que, sendo uma igreja protestante, utiliza o termo “evangélica” e já desde a sua fundação que a AEP teve alguns Presidentes protestantes, além da boa colaboração entre estas duas organizações. Temos também o caso de algumas igrejas históricas ligadas à AEP.

Uma das características dos evangélicos (ou fundamentalistas) a nível mundial, é considerarem-se como os únicos fiéis a Cristo, e os outros protestantes como não sendo verdadeiramente cristãos, pelo que, muitas vezes, são alvo do seu proselitismo.

Esta característica reflecte-se na atitude das igrejas protestantes e evangélicas perante o movimento ecuménico. Geralmente as igrejas protestantes (refiro-me às igrejas do protestantismo histórico) são mais abertas ao movimento ecuménico, ao contrário do sectarismo dos evangélicos que os leva a dividirem-se em várias denominações e quase toda a sua literatura devocional e teológica, hinários, e revistas de escola dominical, etc. são traduções de literatura norte-americana, geralmente sem a preocupação com a sua transculturação.

 

Neste início do século XXI, volta a falar-se muito em “fundamentalismo”, mas por outros motivos. Fala-se muito em fundamentalismo islâmico, judaico, hindu e em fundamentalismo evangélico ou americano.

A palavra fundamentalismo deixou de estar limitada ao contexto teológico protestante para se aplicar a outras religiões. Suponho que o termo “fundamentalismo islâmico”, seja uma expressão nova, pois não sei se essa palavra “fundamentalismo” aparece na teologia islâmica ou de outras religiões. Mas, como é habitual, nesta nossa página na internet, em que cada um diz o que é e em que crê, desde já convido algum teólogo islâmico ou de outras religiões, que queira escrever sobre o assunto.  

 

 

4 - Semântica da palavra “fundamentalismo”

 

Neste início do século XXI, a expressão “fundamentalista cristão” adquire um novo significado, em especial na linguagem secular.

Já não significa, como no ano 1920, alguém que acredita nos fundamentos da fé cristã, mas alguém que segue à risca, todos os ensinamentos da Bíblia e aplica nos nossos dias, conceitos, ideias e mandamentos do tempo de Moisés, há mais de 3000 anos, como se fossem escritos nos nossos dias, para a nossa realidade. Essa perigosa interpretação da Bíblia, transforma os fundamentalistas em perigosos elementos, como adiante iremos mostrar.

A palavra “fundamentalista” está ligada a actos de violência, mortes, massacres, desde as “cruzadas” dos fundamentalistas americanos dos nossos dias contra o Afeganistão e o Iraque, ao ataque às torres gémeas de Nova Iorque.

Fundamentalista passou a ser sinónimo de terrorista com motivação religiosa evangélica, islâmica ou de outras religiões. Aconselho a leitura do artigo Cruzada americano/batista (CC) onde relaciono várias notícias que recebi.

 

 

5 - Qual o perigo do fundamentalismo?

 

Iremos tratar do fundamentalismo cristão, e esperamos que algum teólogo islâmico aceite o nosso convite para abordar o caso do fundamentalismo islâmico sob o aspecto teológico. Como já afirmámos, estamos receptivos a outras contribuições, de budistas, judeus, hindus etc, que nos queiram enviar as suas contribuições, abordando o fundamentalismo nas suas próprias religiões. Claro que todas as religiões se fundamentam nos seus textos sagrados, mas refiro-me ao “fundamentalismo” com o significado que adquiriu nos nossos dias, como a atitude de interpretar os antigos textos religiosos ignorando o contexto histórico e cultural em que foram escritos, por vezes bem diferente da nossa realidade.

Poderá alguém perguntar: Mas, se o fundamentalista cristão segue à risca, tudo que é bíblico, qual o motivo desse perigo?

Pessoalmente, penso que se trata dum grave erro teológico. Aceito que Jesus o Cristo é a Palavra de Deus, como aliás é bem claro nos primeiros versículos do Evangelho de João, e acredito que a Bíblia contém a Palavra de Deus, por revelar a Jesus Cristo. Mas a vulgar teologia evangélica afirma que toda a Bíblia é a Palavra de Deus eterna e imutável, como aliás encontramos no ponto 5 da Declaração de Fé da Aliança Evangélica Portuguesa.

5. Cremos na inspiração divina e total das Escrituras Sagradas, na Sua suprema autoridade como única e suficiente regra em matéria de fé e de conduta e que não existe qualquer erro ou engano em tudo o que ela declara.  

Todos os livros canónicos são considerados igualmente inspirados e igualmente inerrantes, sem qualquer diferença entre eles. Tão importante é o livro de Deuteronómio ou de Josué, como o Evangelho de João.

Ora a Bíblia tem duas partes perfeitamente distintas e dificilmente reconciliáveis. O Velho Testamento aceite pelos judeus, e o Novo Testamento escrito após a vida de Cristo, onde está registada a sua mensagem.

Qualquer teólogo cristão (protestante, evangélico, católico ou ortodoxo), quando confrontado com certas passagens horrorosas do Velho Testamento, dirá certamente que “o Velho Testamento tem de ser lido à luz da mensagem de Jesus”. Penso que têm certa razão nesta afirmação, mas isso vem desmentir a inerrância do Génesis ao Apocalipse, ou a igual inspiração, pois a mensagem de Jesus, é sempre aceite como a “chave hermenêutica” para a interpretação de toda a Bíblia, não estando portanto ao mesmo nível que a mensagem de Moisés. E que dizer de Mateus 5:21/48 onde Jesus põe em destaque os seus mandamentos em relação “ao que foi dito aos antigos”?!! Sobre este assunto, aconselho a leitura do meu artigo “A Bíblia é a Palavra de Deus? (CC)

Duma maneira geral, tanto católicos, como protestantes ou evangélicos, seguem o pensamento de Santo Agostinho, que considerou toda a Bíblia como inerrante. Mas enquanto católicos e protestantes fazem um exame mais aprofundado, tomando em atenção o contexto histórico das passagens, o vulgar evangélico, aceita todas as afirmações em pé de igualdade, por serem bíblicas, como se fossem escritas nos nossos dias.

Considero que, logo no início dos evangelhos, a mensagem de João Batista fez estremecer toda a velha teologia, onde havia racismo, xenofobia, forte discriminação da mulher e onde estava prevista a escravatura e a pena de morte para muitas e variadas situações, com manifesto desprezo pela vida humana. Mas quando Jesus apresentou a sua mensagem, toda a velha teologia foi revogada e todos os textos veterotestamentários se tornaram deuterocanónicos, com o significado de menos inspirados ou de inspiração duvidosa. Daí a necessidade de “serem lidos à luz da mensagem de Cristo”.

De nada serve condenar os fundamentalistas evangélicos, enquanto não houver a coragem de os compreender. Talvez os teólogos sejam os principais culpados, pois tais fundamentalistas são consequência da teologia veterotestamentária, que aliás, até o Israel dos nossos dias, teve o bom senso de rejeitar, pois já não é uma teocracia, mas um país dos nossos dias, com a sua Constituição.

Antigamente, havia nas igrejas protestantes e evangélicas em Portugal, a salutar tradição da Escola Bíblica Dominical participativa, para adultos, com debate teológico, tradição que praticamente se perdeu. Poucas são as igrejas protestantes em Portugal que mantêm em funcionamento a Escola Bíblica Dominical para adultos. Nas igrejas evangélicas, por vezes essa salutar tradição ainda se mantém, mas sem um sério incentivo à livre meditação.

No Brasil, pelo que vi, da última vez que lá fui, no ano 2000, a Escola Dominical já pertence ao passado, com sérias consequências na preparação teológica dos crentes.

Nos últimos anos, o protestantismo em geral, está perdendo as salutares tradições da Reforma Protestante, que colocou a Bíblia nas mãos do povo, para que todos a pudessem interpretar e se está tornando mais parecido com o ambiente do Velho Testamento, contra o qual Jesus lutou e morreu, ambiente em que não havia liberdade de expressão nem liberdade de religião. Os israelitas só foram libertos dessa ditadura teológica com a invasão romana que lhes concedeu liberdade de pensamento e de expressão, e inclusive a liberdade de religião.

É vulgar, desviar as atenções dos crentes de certas passagens veterotestamentárias, através dos leccionários e dos programas para leitura de toda a Bíblia em dois ou três anos, que estabelecem as passagens a serem lidas e comentadas. Não deixo de reconhecer os aspectos positivos desses documentos, mas não podemos ignorar que na prática, acabam por funcionar como um “cânon do cânon”, que apresenta as mesmas passagens, geralmente de três em três anos, encobrindo outras que nunca são lidas nem comentadas.

Duma maneira geral, penso que todas as religiões são perigosas, principalmente as monoteístas, e as que exigem uma espécie de “suicídio intelectual” que confundem com conversão ou o “novo nascimento”. Nesse “suicídio intelectual”, que corresponde à morte do homem velho, com os seus defeitos e virtudes, para renascer um novo homem, o maior perigo está nesse novo homem, quando “nasce” um perigoso fanático, telecomandado pelos seus dirigentes espirituais, que classificam qualquer pensamento em dissonância com a sua igreja, como perigosa heresia. Assim, o “novo homem”, logo aprende e reprimir a sua consciência e seu pensamento para adoptar uma “cómoda” posição heterónoma que nada tem a ver com o “novo nascimento” a que Jesus se referiu.

É nesse ambiente das igrejas “evangélicas” que surgem os fanáticos fundamentalistas evangélicos, mais prontos a matar do que a morrer pelos seus ideais.

 

 

6 – Jesus era fundamentalista?

 

Esta é a pergunta mais importante para um verdadeiro cristão.

Será que o Mestre defendia uma obediência cega e incondicional às Escrituras, como Moisés ensinou?

Vamos comparar as duas seguintes passagens:

 

Deuteronómio 6:5 Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças.

 

Lucas 10:27 Respondeu-lhe ele: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo.

 

À primeira vista, as duas passagens parecem muito semelhantes, mas há uma grande diferença entre as palavras de Moisés, em Deuteronómio, que todos os fundamentalistas podem facilmente aceitar, e as palavras de Jesus no evangelho de Lucas.

Enquanto Moisés exige uma obediência cega, e não faz qualquer referência ao entendimento, Jesus não prescinde de todo o nosso entendimento, ou pensamento, ou reflexão, ou meditação, como se queira traduzir, e faz uma referência ao amor pelo próximo que não pode ser ignorado. O amor a Deus, não pode ser dissociado do amor ao próximo.

Mas mais do que palavras, temos o exemplo do nosso Mestre.

 

 

7 – O Deus em que acredito

 

Não basta dizer que se acredita em Deus. Tenho medo dessa afirmação, sem saber a que deus se referem, e o que entendem por Deus.

Creio no Deus supremo, que está para além da compreensão humana, creio num ser que é a origem de todo o Universo.

A mentalidade fanática, fundamentalista, tem sempre a preocupação de reduzir o Deus supremo, para o encaixar na sua teologia ou na sua organização.

O deus que cabe dentro das quatro paredes da igreja, ou da mesquita, ou da sinagoga ou de qualquer outro templo religioso, não é certamente o Deus verdadeiro que alguns preferem tratar por Jeová, outros por Allah, outros por Brahman ou pelos adjectivos o Supremo, o Deus dos exércitos etc.. mas Jesus nos ensinou a tratar por Pai.

O importante não é o nome de Deus, mas o que esse nome significa para cada um de nós. Talvez o tratamento por Pai, que cada povo poderá traduzir na sua própria língua, seja o mais indicado. Jesus escandalizou os “grandes” e “entendidos” do seu tempo, quando em Mateus 6:9 ensinou a tratar a Deus por Pai.

O Deus supremo, o Pai, a origem de tudo, nunca poderá estar comprometido com nenhum povo, nenhum local, nenhuma cultura. Só esse poderá ser o Deus verdadeiro que Jesus revelou, quando se demarcou de Israel e do Templo de Jerusalém. Jesus afirmou que …onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles. Mateus 18:20. Não são necessários quaisquer rituais nem hierarquias, nem fronteiras teológicas. Deus conhece os que verdadeiramente o procuram.

 

 

8 - Conclusão

 

Gostaria de me limitar a tentar compreender o fundamentalismo cristão no aspecto teológico, pois a influência da teologia é muito maior do que parece e penso que todas ou quase todas as guerras, se não tiveram um motivo teológico como causa principal, houve certamente a motivação teológica como poderoso elemento “catalizador” da agressividade humana.

O Velho Testamento tem vários exemplos de como a religião serviu para aumentar a ferocidade das guerras. Vejam em Josué 8:9/30, 1º Samuel 15:3 ou Números 31:14/18. Estes são alguns dos exemplos com que os ateus ficam horrorizados, mas os mais “entendidos” e mais “espirituais” ficam impassíveis devido à sua “maturidade espiritual” que depois de cinquenta anos de crente, me recuso a aceitar. São as tais passagens que não costumam ser mencionadas nas igrejas, mas já muitos sabem onde estão. Nomeadamente na última passagem em Números, é bem visível a atitude mais humana dos próprios oficiais do exército de Israel que a sua religião transformou naquilo a que os ateus chamariam certamente de criminosos de guerra.

Encontramos em Mateus 5:21/48 várias vezes a expressão de Jesus «Ouvistes que foi dito aos antigos... Eu, porém, vos digo...» E é só isso, a mensagem do Mestre, que nos deve interessar. Verdadeiro cristão é aquele que segue a Cristo e somente a Cristo.

A quem seguimos nós? A Cristo e a Moisés? A Cristo e aos antigos? Ou somente a Cristo?

Estou seriamente preocupado, porque depois de vinte séculos de cristianismo, quando mais importantes deveriam ser as palavras do Mestre, muitos que se identificam como evangélicos, inclusive muitos pastores, esquecem as palavras do Mestre para seguirem as palavras dos antigos. Depois de vinte séculos de cristianismo, a esses crimes horrorosos do Velho Testamento, chamam de “manifestação do poder de Deus”.

Tais atitudes só poderão ser compreendidas nesse contexto histórico de há 3200 anos, na pré-história da teologia, e nunca depois do Filho de Deus nos ter apresentado o seu Evangelho. Tudo isso, que disseram os antigos, está revogado pela mensagem de Jesus, o Cristo, que continua a ser a única solução para os nossos dias..... Mas quem a irá aceitar, se até os próprios que se dizem cristãos já a esqueceram, ou seguem numa atitude fundamentalista os horrores do Velho Testamento, que consideram como palavra de Deus, eterna e imutável?

 

A verdade é que todas as religiões falam em paz e amor entre a humanidade. É tudo muito bonito. Mas… quais os resultados? Basta ver a informação que chega pelas nossas TVs:

 Irlanda do Norte com a luta entre católicos e protestantes. Esperemos que o vergonhoso problema esteja definitivamente ultrapassado.

Afeganistão e Iraque, com o ataque dos evangélicos americanos ao mundo islâmico, ignorando a ONU.

Líbano e Israel, com a luta entre judeus e islâmicos.

Fronteira entre Índia e Paquistão, com a luta entre hindus e islâmicos, que esperemos que tenha terminado.

Desculpem…. Mas não resisto a perguntar: E se espalhássemos o ateísmo a todos estes países, qual seria o resultado?!!

Não acredito que as guerras terminassem, mas pelo menos seriam mais humanas, pois se comportariam como homens que são, e não como deuses que não são, pois os deuses são conflituosos e sanguinários, como nos mostram aqueles que neles acreditam.

Por vezes, as religiões afirmam que só haverá verdadeira paz, quando todos aderirem a essa religião. Mas como poderá alguém aceitar tal afirmação ignorando as lutas internas nas várias religiões? Como poderá o cristianismo ser a solução para a paz mundial, se há bem pouco tempo, católicos e protestantes lutavam entre eles na Irlanda do Norte? Como poderá o Islão ser a solução para a paz mundial, se sunitas e xiitas se matam uns aos outros em vez de se unirem perante o invasor do seu território?

Já é tempo de procurar o Pai comum a toda a humanidade, que Jesus nos revelou, e que cada um poderá chamar de “Pai”, na sua língua e na sua cultura, o Pai, para quem não existem fronteiras culturais, políticas, nacionalistas, litúrgicas, teológicas ou quaisquer outras que O possam impedir de responder a quem O procura directamente, o Pai que poderá responder a quem entender, quando e onde decidir, utilizando os métodos que entender, mesmo os métodos que escandalizam os “religiosos”, ultrapassado todas as fronteiras construídas pelos que querem monopolizar a sua mensagem, pois só Ele é soberano.

 

Camilo – Marinha Grande, Portugal

Janeiro de 2007

 

Bibliografia: “Enciclopédia Histórico-teológica da Igreja Cristã” – Edições Vida Nova, SP.

                    Conversions and Citizenry” Rev. Délio Mendonça - Nova Deli, Índia.

 

 

 

Estudos bíblicos sem fronteiras teológicas