Atentado
de Nova Iorque em face da Bíblia (CC)
(Deverá “clicar” nas referências
bíblicas, para ter acesso aos textos)
Tenho lido muitos comentários publicados em páginas evangélicas na
internet que relacionam os últimos acontecimentos em Nova Iorque com as
profecias bíblicas.
Na verdade, há muitas referências a torres nos textos bíblicos,
mas a maior parte dessas passagens são passagens históricas, simplesmente
descritivas e não nos parece que sejam profecias. Mas não podemos deixar de
notar uma constante em todas essas referências, desde a Torre de Babel em Génesis 11:1/9,
a Torre de Penuel em Juízes 8:1/17, Juízes 9:51/52, Sofonias 3:1/7,
a Torre de Siloé em Lucas 13:1/5 e
em muitas outras passagens, as torres são quase sempre um símbolo do domínio,
da arrogância dum povo, da sua superioridade e estão quase sempre relacionadas
com guerra, morte e destruição. Alguns relacionam este acontecimento com Apocalipse 18.
Eu nunca tive muita vocação para as profecias, pois é terreno
difícil demais para mim. É preciso ter muita cautela nas interpretações que
damos, para não nos entusiasmarmos demasiado e também é necessária suficiente
humildade para confessar a nossa ignorância e as nossas dúvidas. Mas também não
podemos ir para o campo oposto, ignorando as profecias.
Realmente, muito do que se passou, “encaixa” de certa maneira
nesta passagem bíblica. O escandaloso luxo dos ricos
cada vez mais ricos que simplesmente ignoram os milhões de pessoas que passam
fome no mundo inteiro e muitos que morrem à fome. As duas torres que foram
destruídas, eram o símbolo máximo do capitalismo arrogante e indiferente aos
problemas da humanidade. Essa, não sei se ignorância, se indiferença ao que se
passa para lá das fronteiras do mundo ocidental, nomeadamente dos USA, tem
levado a declarações não muito verdadeiras de alguns pastores evangélicos de
influência americana. Alguns afirmam que nunca se viu um caso destes, quando em
África se têm registado números de mortos infelizmente muito mais elevados,
outros referem-se ao maior genocídio da história moderna (não sei quais os
limites da história moderna), mas muito pior fizeram os americanos em Hiroshima e Nagasaqui. Penso que
a grande publicidade que as televisões de todo o mundo dão a este acontecimento
tem uma explicação: É porque desta vez a desgraça não aconteceu em algum país
no interior de África ou em alguma região pobre do interior do Brasil, mas em
Nova Iorque, e desta vez não foram pobres desgraçados que morreram mas sim,
altos executivos e importantes homens de negócio.
Algumas notícias que nos chegam pela televisão, lembram-nos o
versículo 3 deste capítulo Porque ela
embriagou as nações com o vinho do furor da sua prostituição; com ela se
prostituíram os reis da terra, e os mercadores da terra se enriqueceram graças
ao seu luxo desenfreado Apocalipse 18:3
Quando vemos até países islâmicos colaborarem no ataque a um país independente
aliciados pela promessa de ajuda económica, entrar em guerra por causa da
promessa de ajuda económica, não é isso a corrupção dos países?!!
E quanto não receberam os seus governantes?!!
Dos grandes impérios do passado, que tiveram as suas colónias pelo
mundo inteiro, com o tempo todos foram passando à história e Portugal também
foi colónia romana e mais tarde teve as suas colónias. Nos nossos dias
assistimos à desagregação da Rússia como grande potência mundial, mas mal de
nós, que se acabou o tal equilíbrio de forças e a partir dessa altura a América
se tornou a única super-potência a impor o seu cada vez mais arrogante colonialismo
económico e cultural em todo o mundo. Assim, o mundo rico está cada vez mais
rico e os pobres são cada vez mais pobres e em maior número. Nesse aspecto,
vejo grandes semelhanças com essa passagem do Apocalipse. Até nas nossas
igrejas ditas evangélicas se nota o tal colonialismo cultural, com a influência
cada vez maior duma lógica de direita na interpretação dos textos bíblicos bem
como da influência da língua inglesa e o desrespeito pelas outras culturas.
Mas a “Grande Babilónia” dos nossos dias ainda não caiu e estou um
tanto pessimista quanto ao futuro. Penso que estamos perante o início duma
reacção a nível mundial contra a “Grande Babilónia”, que não é propriamente um
país, mas o conjunto dos países mais ricos deste mundo, os donos das “Nações
Unidas” onde não há igualdade entre os países pois uns têm direito a veto e
outros não. Penso que será uma guerra para durar. Agora foram os aviões, amanhã
poderá ser a guerra química ou a guerra biológica que não conhece fronteiras...
Mesmo que encontrem e se vinguem nos responsáveis por este atentado de Nova
Iorque, outros se irão levantar, enquanto o problema que lhes deu origem, a má
distribuição da riqueza a nível mundial, não for resolvido, pois o terrorismo é
sempre fruto da miséria e do desespero que serão maiores com a intervenção
americana que se prepara. É impossível algum país ou grupo de países controlar o mundo inteiro,
pois nem o território dos Estados Unidos inteiro conseguirão controlar.
As notícias da TV mostram uma certa unanimidade dos governantes de
todo o mundo em condenar este atentado. Não digo que não seja verdade, mas digo
que uma coisa é condenar o atentado, outra bem diferente é apoiar a reacção
americana de atacar países independentes por sua iniciativa, e o que vemos nos
canais de TV é somente a posição oficial dos governantes e não a posição dos
milhões de pobres e explorados de todo o mundo, inclusive na Europa. Um pouco
por todo o mundo se vão levantando mais críticas à intervenção americana que se
prepara para atacar o Afeganistão e tenho sérias dúvidas sobre o seu resultado.
Segundo sondagens à opinião pública, em Portugal, 48.8% dos portugueses apoiam
esta guerra, 40% são contra, o resto não tem opinião e entre os partidos
políticos também não há unanimidade. Penso que um pouco por toda a Comunidade
Europeia a opinião popular não deve ser muito diferente, mas bem diferente será
a opinião pública no Paquistão, pelo que após a identificação deste país com os
USA, só vejo duas possibilidades para o futuro do Paquistão, ou tornar-se numa
ditadura militar ao serviço dos americanos ou tornar-se mais um país islâmico
fundamentalista e neste caso, trata-se duma potência atómica.
Penso que têm certa razão, os que identificam o capítulo 18 de
Apocalipse com os recentes acontecimentos, pelo menos, temos demasiadas
semelhanças para poder deixar de relacionar as duas coisas e julgo que este é
um dos primeiros acontecimentos da época da história que se aproxima. Não nos
compete julgar ninguém e como crentes não podemos apoiar a violência, mas temos
de estar atentos aos sinais do que se passa nos nossos dias.
Os países islâmicos fundamentalistas, se é que alguns deles
tiveram certa responsabilidade nestes ataques, são países onde não há liberdade
de expressão, e muito menos liberdade de religião e exercem forte discriminação
da mulher. Não nos podemos identificar com eles.
Mas não podemos esquecer que a América, que pretende chefiar os
países “livres” é o primeiro país a empregar a bomba atómica em Hiroshima e Nagasaqui, e nos
nossos dias não respeita o protocolo de Kioto sobre o
aquecimento global do planeta, aceite por todo o mundo, somente para não
prejudicar a rentabilidade das suas indústrias, já iniciou o desenvolvimento de
armas biológicas que todo o mundo civilizado decidiu proibir e ainda
recentemente a representação americana no Congresso sobre o racismo na África
do Sul abandonou os trabalhos. Poderíamos ainda citar a pena de morte,
rejeitada pelo mundo civilizado, que ainda se mantêm nesse país “livre” tal
como nos países islâmicos fundamentalistas. Não nos podemos identificar com
este país que representa o maior perigo dos nossos dias.
Mas então o que fazer? Como crentes evangélicos não podemos ficar
indiferentes ao que se passa à nossa volta, mas há que manter o bom senso de
não nos envolvermos nesta espiral de violência e ódio que parece assolar todos
os países e religiões.
Muitos falam no cobarde ataque ao WTC... mas será credível um
piloto suicida ser acusado de cobardia? Outros falam no ataque dos
descrentes... mas será que são descrentes, ou isso é termo que designa todos
que têm uma fé diferente? Também para os islâmicos, os infiéis são os cristãos.
Parece que é de fazer um apelo a todos os verdadeiros crentes,
cristãos, islâmicos ou judeus, para que tenham o bom senso de não se deixarem
levar pelos fundamentalismos exaltados e irracionais dos profissionais das
religiões que só conduzem à destruição.
Todas as religiões dos nossos dias falam em paz e em amor, mas
incitam à violência e à guerra. Será que se fosse possível “ateizar”
o mundo todo, daríamos a maior contribuição para a paz mundial, pois os
problemas da Irlanda do Norte, da Palestina, dos americanos e fundamentalistas
islâmicos, e da fronteira entre a Índia e Paquistão, deixariam de ter sentido?
Ou será que a mensagem de Cristo e o seu incentivo ao amor pelos inimigos é só
para os cultos de domingo de manhã, mas já perderam o seu significado para aos
que se dizem cristãos?
Penso que, o que podemos fazer é falar, e a internet pode dar uma
boa contribuição como meio de comunicação. Parece pouco, mas não é assim tão
pouco como parece e alguns irmãos já fizeram muito, levantando o problema com
coragem, remando contra a opinião geral, raciocinando sem a tutela dos seus
dirigentes espirituais.
Com todas as suas falhas a América ainda é uma democracia, embora
a caminho da “dinheirocracia”, e o povo americano
necessita de ouvir outras vozes e outras opiniões que venham de fora das suas
fronteiras, pois afinal ainda são eles que com todas as falhas da sua
organização elegem os seus representantes e podem mudar a atitude do seu país,
pois o problema de fundo não foi só o recente ataque a Nova Iorque. Concordo
com a afirmação do Papa de que este problema não pode ser resolvido pela força
das armas. Se o problema de fundo, a má distribuição da riqueza a nível mundial
não for resolvido, outros ataques cada vez mais violentos certamente se
seguirão.
Mas ainda é tempo... Temos pouco tempo, mas ainda é tempo de
falar.
Camilo -
Marinha Grande, Outubro de 2001
Estudos bíblicos sem fronteiras
teológicas