Velho ou Antigo Testamento? (MC)

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1ª Parte

 

A maioria das versões modernas da Bíblia chama “Antigo Testamento” à primeira parte da coletânea de livros que a compõem, mas há quem prefira designá-la por “Velho Testamento”. Ambas têm defesa, mas penso que seria desejável optar por uma só das expressões. Pessoalmente, defendo o adjetivo “Antigo”, porque este transmite uma ideia mais positiva da Aliança (Testamento) estabelecida entre Deus e o povo israelita.

 Antigo dá uma ideia de precedência no tempo e não tem, como Velho, uma conotação de decadência. Aliás, a língua portuguesa faz isso noutros contextos. Por exemplo, um jornal informa: “Falou em seguida o Dr. Jorge Sampaio, antigo Presidente da República”. O Dr. Jorge Sampaio não é propriamente um jovem, mas seria inadequado dizer que o orador fora o velho Presidente da República. Uma mulher que se divorciou e voltou a casar falará do seu antigo marido e do seu novo marido, mas pode acontecer que o primeiro marido tenha agora 45 anos e o novo vá já nos 60.

É a esta luz que se compreende um dito espirituoso do técnico desportista e compositor Moniz Pereira que, numa entrevista à RTP2 em 2010, ao perfazer 89 anos, disse: “Sou muito antigo, mas velho não sou!”…

Manuel Pedro da Silva Cardoso

Figueira da Foz – Portugal

Julho de 2011.

 

 

Comentários recebidos

 

 

Walmir T. Monteiro - Crente só em Cristo - Bahia - Brasil.

Julho de 2011

Eu prefiro a expressão “Velho Testamento” Porque vejo que a lei foi inútil e fraca e não aperfeiçoou coisa alguma Hebreus 7:18/19. A decadência da lei é evidente nas páginas do NT.

O autor da carta aos hebreus deixa claro que a antiga aliança foi tornada VELHA, e o que envelhece perto está de ACABAR (já acabou).

Dizendo nova aliança, envelheceu a primeira. Ora, o que foi tornado velho, perto está de acabar. Hebreus 8:13 O sentido de antigo aqui não combina com a frase.

Paulo também deixa claro que a lei é velha ou caduca: Mas agora temos sido libertados da lei, tendo morrido para aquilo em que estávamos retidos; para que sirvamos em novidade de espírito, e não na velhice da letra. Romanos 7:6

É mais correta a expressão “Velho testamento2ª Coríntios 3:14

 

 

 

Afonso Anciães Felício – Porto, Portugal

Julho de 2011

Apreciei o texto que o Pastor Manuel Pedro Cardoso apresentou na sua página.

Começo por afirmar que concordo com a sua opinião de que o adjectivo Antigo Testamento, tem uma carga sensível, que o próprio Autor explica e fundamenta.

Há uma grande tradição de palavras que com o tempo ficam sedimentadas no nosso léxico comum, como é o caso. Porém, ao analisar este caso em especial, fui encontrar muitas referências em cinco Bíblias de editoras muito conhecidas, em que a referência que vem logo na abertura é a palavra Antigo Testamento. Apenas encontrei duas edições que usam o adjectivo Velho, sendo uma delas, uma tradução da Vulgata de A. Figueiredo de 1881.

Não sou especialista em Filologia, mas fui aprendendo com a leitura de autores clássicos, que o uso da palavra tem de ser cuidadosa, para que ela atinja o sentido e a nobreza do tema de que se propõe definir.

Aliás devo confessar que, como qualquer pessoa, muito aprecio um bom texto ou um bom estudo de qualquer assunto com interesse, sendo para mim muito importante ver o Escritor ou Orador usar palavras ou frases de forma objectiva, claras e que enriqueçam o vocabulário de quem lê ou escuta.

 

 

 

David de Oliveira – Goiânia, Brasil

Julho de 2011

Eu também sou adepto da expressão “Velho” Testamento e se há alguma conotação pejorativa do termo é a própria coletânea do “Novo” Testamento que nos dá esse entendimento. O termo “velho” é mais compreendido como algo ultrapassado e que caiu em desuso por algo melhor e mais novo e não como o que somente tem mais idade.

Para ser mais direto nesse assunto, temos que tomar como referência certos textos que são bem conclusivos, que não exigem esforços de interpretações e de importância crucial. A Lei de Moisés e os ensinamentos dos profetas deveriam desaparecer até a época de João Batista, que é a mesma de Jesus incarnado. Assim diz o “novo” Testamento:

Lucas 16:16 - A Lei de Moisés e os ensinamentos dos Profetas duraram até a época de João Batista. Desde esse tempo a boa notícia do Reino de Deus está sendo anunciada...

Ora, até para o mau entendedor esse texto é suficiente para chegar à conclusão de que há uma linha limitadora entre as duas alianças.

Enquanto uma acaba, a outra começa. Se tirarmos o ministério dos profetas e toda a Lei de Moisés, o que é que sobraria do Velho Testamento em termos espirituais para não o consideramos velho e ultrapassado?

Também há o aviso direto de que a Lei de Moisés era temporal e provisória, vejam:

Gálatas 3:19 Logo, para que é a lei? Foi ordenada por causa das transgressões, até que viesse a posteridade (Jesus) a quem a promessa tinha sido feita...

Gálatas 3:24  De maneira que a lei nos serviu de aio, para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados.

Gálatas 3:25 Mas, depois que veio a fé, (Jesus) já não estamos debaixo de aio (instrutor, lei).

Enquanto a Igreja de Jesus não se desvincular dos ensinos do Velho Testamento, não estaremos prontos para cumprir o principal mandamento de Jesus que é amar o próximo como a nós mesmos, o que seria a solução de todos os problemas da humanidade.

 

 

 

Camilo Coelho – Marinha Grande, Portugal

Julho de 2011

Como o autor do artigo afirma, ambas as expressões, Velho ou Antigo, têm defesa possível. É verdade que o termo Antigo, transmite uma ideia mais positiva, mas o importante não é a ideia que transmite o nome que lhe dermos, mas a ideia que transmitem os próprios textos veterotestamentários.

Penso que convém demarcar mais nitidamente a mensagem de Cristo da mensagem veterotestamentária, que nem Israel dos nossos dias leva a sério, pois já não é uma teocracia, mas um país secular nos nossos dias.

O principal problema não é só uma questão de escolher a expressão mais correcta. Isso seria um problema secundário. Noto uma certa unanimidade quanto ao significado da expressão Velho que significa ultrapassado, que já não está em vigor, já não se aplica aos cristãos, e Antigo, significando somente que veio primeiro, mas ainda é útil, ainda está em vigor. Este conceito sobre o Velho Testamento é que considero da máxima importância na nossa teologia.

Aqueles que me conhecem, ou já leram alguns dos meus artigos, certamente que não terão dúvidas de que defendo a expressão Velho Testamento. Mas, para não me tornar repetitivo, menciono os meus artigos A Bíblia é a Palavra de Deus? (CC), Velho Testamento (CC) e Que fazer com o Velho Testamento? (CC)

Como cristão, não posso seguir as leis de Moisés, pois recuso-me a apedrejar os leprosos Números 5:1/4, ou a aplicar a pena de morte a quem trabalhar ao sábado Êxodo 31:12/14, ou a quem tocar em algum cadáver e entrar no Templo sem complicados rituais de purificação, assunto a que me refiro no artigo Santidade ao Senhor - Bom Samaritano (CC). A maior parte dessas leis está completamente ultrapassada e se torna até ridícula nos nossos dias, como por exemplo Deuteronómio 23:13 ou Êxodo 21:7, além de muitas delas, manifestarem um grande desprezo pela vida humana incompatível com a mensagem cristã. Não consigo seguir a Cristo (NT) e a Moisés (VT).

Compreendo que, no passado, a Igreja Católica tenha impedido a leitura da Bíblia, devido a certas passagens do Velho Testamento que são um incentivo à violência, ao racismo, xenofobia, forte discriminação da mulher e outras passagens totalmente ultrapassadas pela mensagem de Cristo. Actualmente o problema está praticamente resolvido com a lista das passagens que são lidas em cada domingo, listagem que se repete de três em três anos (leccionário), que é obrigatório para todo o sacerdote católico e aconselhado nas igrejas do protestantismo histórico. Na prática, acabou por se formar um “cânon do cânon” onde não aparecem as passagens mais escandalosas a que me refiro, que muitos crentes desconhecem.

Nas igrejas, somos treinados a pensar que a Bíblia funciona como um todo, havendo uma grande semelhança entre o Velho e o Novo Testamento. Certamente que há muito de positivo, mas não prescindo de afirmar que nem tudo é bom no Velho Testamento, e nem tudo teve o apoio do nosso Único Mestre. 

Penso que o Velho Testamento teve uma influência bem negativa no Cristianismo e no Islamismo, com o seu apelo à guerra, forte discriminação da mulher, racismo e violência em geral. Não tenho dúvidas em apoiar o termo Velho Testamento. 

 

 

 

João Alberto Teodósio – Crente evangélico. Industrial da Marinha Grande, Portugal

Julho de 2011

Velho ou Antigo Testamento? Na minha opinião depende do conceito que damos às palavras… Classificar de Velho ou Antigo Testamento deve ajustar-se à nossa crença e aos princípios da nossa fé e prática cristã.

Para mim, Velho Testamento tem maior rigor, dado que a minha salvação me é prometida, baseada nos ensinos do N.T. ou seja, deixei de ser escravo da velha lei e aceito o sacrifício de Cristo que a suplantou. A base da minha crença assenta essencialmente nos ensinos do N.T.

Quando procuramos um antiquário, encontramos preciosidades, antiguidades de valor incalculável.

Numa casa de velharias encontramos coisas de valor rudimentar, muitas vezes apreciamos somente o valor nostálgico ou histórico.

Nestes exemplos acho que antigo é menos apropriado dado que para o cristão o V.T. não constitui uma razão determinante nem consolida o valor da sua fé… (Não é uma preciosidade)

Jorge Sampaio é antigo Presidente português; o seu valor, as suas ideias, os seus princípios etc. etc. não se alteraram, ele pode até voltar a ser de novo Presidente da república, mas o valor as ideias, os princípios do Velho Testamento jamais voltarão…

Antigo; tem um significado de maior nobreza, de mais valor, mais intelectual etc.

Velho; é mais marginal, fora de moda, desactualizado etc.

Vamos continuar a trata-lo por Velho porque familiarmente até se torna mais carinhoso.

O qual nos fez, também, capazes de ser ministros de um Novo Testamento, não da letra, mas do Espírito; porque a letra mata e o Espírito vivifica. 2ª Coríntios 3:6

 

 

 

Michael Knoch – Pastor presbiteriano, Tramagal, Portugal

Julho de 2011

Caros Cristãos e Judeus,

Permito-me também um comentário teológico. Aprendi usar os termos 1ª e 2ª aliança. Ou melhor ainda: “1000 anos e um dia” (titulo do livro de Claus Westermann), Prof. Para AT.

Acho dois aspectos importantes:

- O Antigo Testamento não é meramente propriedade dos Judeus, alias, não é propriedade nenhuma, mas uma colecção de livros da Humanidade ou melhor, da história de Deus com os Homens. Não serve para justificar p. ex. a politica de Israel.

- Não podemos desprezar ou negligenciar o Antigo Testamento, porque fala de Deus na história e terra dos homens que são todos iguais. Se não, a fé cai num dogmatismo grego.

Hoje em dia a filosofia judaica, torna-se algo de fundamental, Husserl, Rosenzweig, Levinas, Derrida, Ouaknin.

 

 

 

 

Velho ou Antigo Testamento? (MC)

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2ª Parte

UMA POLÉMICA SUAVE

 

Foi suave a polémica levantada pela minha despretensiosa nótula sobre o uso das expressões “Velho Testamento” e “Antigo Testamento”. Havia e há no Judaísmo uma notável pluralidade – e essa característica ficou também no Cristianismo. Não falando, obviamente, tanto no Judaísmo como no Cristianismo, dos orgulhosos que se julgam em posse exclusiva da verdade…

Ficamos, portanto, no que diz respeito a este tema de Velho e Antigo Testamento, no nosso pluralismo. Mas é elementar reconhecer que há autênticos tesouros espirituais e literários na coletânea de livros que forma a primeira parte da Bíblia. Basta pensarmos em textos como os três primeiros capítulos do livro de Génesis; e logo depois na chamada e obediência de Abraão, do sacrifício falhado de Isaque; da história de José do Egipto, da servidão e da libertação do país dos faraós, com o protagonismo de Moisés; na epifania do Monte Sinai; na espantosa qualidade dos Dez Mandamentos; na história de Job; nos Salmos, no livro de Provérbios – meu Deus! É um nunca mais acabar de referir textos de um valor inequívoco! Não tem nenhum sentido ver o Antigo Testamento como velharia a merecer o caixote de lixo da História, porque ele é, realmente, antiguidade preciosa.

Como poderíamos compreender a mensagem do Novo Testamento sem conhecer o mundo religioso que o antecedeu? Como compreender a riqueza do Sermão da Montanha, onde Jesus afirma continuamente: “Ouvistes o que foi dito aos antigos…”, se não conhecêssemos os textos que foram apresentados em primeiro lugar aos pais israelitas? Como entender o drama do Calvário sem conhecer as profecias, especialmente de Isaías?

O apóstolo Paulo, que é insuspeito de favorecer a Lei, ocupou-se largamente da questão do povo israelita na sua Carta aos Romanos (capítulos 9 a 11) No capítulo 11, versículo 1, coloca a questão fundamental: terá Deus rejeitado Israel? – dando imediatamente esta resposta: “De modo nenhum!” Quem ler sem preconceito esses três capítulos da Carta aos Romanos verá que no plano de Deus o Povo da Antiga Aliança tem ainda um papel importante a desempenhar. Paulo, que nós consideramos inspirado por Deus, razão por que chamamos também aos seus escritos “Palavra de Deus”, está seguro de que o Israel de Deus, o remanescente do Povo de Israel, se converterá a Cristo e será esse um dos prodígios dos tempos finais Gálatas 6:16.

Estamos a viver dias decisivos, em que as diversas religiões do mundo precisam de abandonar fundamentalismos fomentadores do ódio e de guerras e optar pelo diálogo e a coexistência pacífica. Muitos crentes, felizmente, já o estão a fazer e os crentes cristãos terão de ser os mais dedicados nesse diálogo e nessa coexistência pacífica, pois para eles foi dita esta palavra: “Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de DeusMateus 5:9.

Manuel Pedro da Silva Cardoso

Figueira da Foz – Portugal

Julho de 2011.